Por que a Costa Rica é o país que mais vem atraindo milionários estrangeiros na América Latina


A migração de milionários disparou desde a pandemia, segundo o sócio-diretor da empresa The Agency Costa Rica, Andrés Riggioni
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A Costa Rica é o país onde mais aumentou o número de milionários estrangeiros na América Latina na última década, segundo um ranking de migração de pessoas com patrimônio elevado.
O relatório Private Wealth Migration Report 2025 (“Relatório de migração de riqueza privada 2025”, em tradução livre), elaborado pela consultoria Henley & Partners, indica que a velocidade de crescimento foi de 76% nos últimos 10 anos, o que coloca a Costa Rica no sexto lugar do ranking mundial.
A empresa com sede em Londres comercializa programas de venda de passaportes e autorizações de residência em mais de 40 países. Ela estima que cerca de 8,4 mil estrangeiros tenham migrado para o país centro-americano e prevê que outros 350 chegarão à Costa Rica em 2025.
O estudo define “milionário” como a pessoa que detém patrimônio superior a US$ 1 milhão (cerca de R$ 5,3 milhões) em “ativos líquidos” (bens e valores que podem ser facilmente transformados em dinheiro em espécie, como, por exemplo, ações, fundos em contas bancárias, certificados de depósito ou bônus), excluindo outros bens, como imóveis.
O relatório considera o aumento do número de expatriados ocorrido ao longo da última década. Mas o grande salto migratório na Costa Rica se deu após a pandemia.
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A covid-19 representou um marco no fluxo de milionários para o país, segundo Andrés Riggioni, sócio-diretor da empresa imobiliária The Agency Costa Rica, especializada no mercado de luxo.
Este fato gerou um boom da construção ou compra de propriedades de luxo, com rápido aumento dos preços no mercado imobiliário. Este aumento se verificou especialmente nas regiões costeiras, que viram seus imóveis duplicarem de valor em apenas um ou dois anos.
A covid-19 gerou uma mudança de mentalidade em todo o mundo, entre as pessoas que têm a liberdade e o dinheiro necessário para morar no país que preferirem. O fenômeno ficou conhecido como o “efeito pandemia” sobre os fluxos de riqueza, segundo Riggioni.
Ele explica que, neste sentido, atualmente é mais difícil definir o conceito de residência, já que as pessoas detêm diversos passaportes e transitam de um lugar para outro.
Embora haja estrangeiros estabelecidos, que foram viver de forma mais permanente na Costa Rica, as pessoas classificadas como “milionários”, segundo o critério do estudo da Henley & Partners, são indivíduos que “não moram em um só lugar”, declarou Riggioni à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Eles são pessoas que podem morar metade do ano na sua residência na Costa Rica e o restante do tempo, em outros países.
Surgiram na Costa Rica movimentos de cidadãos que se opõem ao que consideram ‘invasão’ de milionários no litoral do país
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É muito difícil ter acesso às informações sobre o dinheiro líquido de posse de um indivíduo e o domicílio fiscal de uma pessoa, diferentemente do seu local de trabalho ou residência temporária.
Por isso, o relatório foi objeto de críticas devido à sua metodologia e ao uso de certos dados obtidos de fontes como a plataforma LinkedIn, para rastrear a localização das pessoas.
Especialistas consideram que o estudo deveria também incluir os imóveis de propriedade desses milionários para estimar sua fortuna, como foi feito em edições anteriores.
De qualquer forma, o aumento da chegada de milionários que obtêm vistos de residência e de investidores na Costa Rica é um tema amplamente debatido no país, bem como as consequências desta tendência para o mercado imobiliário e para o restante da sociedade costa-riquenha.
Chegaram até a surgir movimentos de cidadãos que se opõem ao que consideram “invasão” de estrangeiros ricos nas zonas costeiras do país.
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Qual é o perfil desses milionários estrangeiros?
As pessoas que estão se mudando para a Costa Rica provêm principalmente dos Estados Unidos e do Canadá. Mas também chegam europeus e cada vez mais latino-americanos, vindo de países como o México, Colômbia ou Venezuela.
Entre os expatriados com grandes fortunas, não há apenas aposentados. Também existem os “semiaposentados”, que não estão envolvidos no dia a dia das suas empresas, mas mantêm a supervisão à distância e podem viver dos seus lucros.
O grupo de semiaposentados inclui pessoas com mais de 40 anos, que não precisam trabalhar e se dedicam a gerenciar seus investimentos.
Alguns deles fazem parte da nova onda de criptomilionários. Seus investimentos em criptomoedas permitiram criar fortunas gigantescas em poucos anos.
Um exemplo da chegada de jovens afluentes é o caso de uma cidade litorânea chamada Santa Teresa, conhecida por alguns como “Praia do Silício”. Ali, já não existem mais à venda propriedades diretamente em frente ao mar, já que ela se transformou em um ímã que atrai milionários e investidores, segundo Riggioni.
O sistema fiscal e o visto dourado
Andrew Amoils é chefe de pesquisas da empresa New World Wealth, que atua como colaboradora do estudo publicado pela Henley & Partners. Ele afirma que uma das vantagens da Costa Rica para os milionários é o seu sistema fiscal.
O país não cobra impostos sobre os ganhos de capital obtidos no exterior. Os lucros obtidos por uma pessoa das suas ações em Wall Street, por exemplo, não são taxados na Costa Rica.
Além disso, a alíquota máxima de imposto de renda, de 25%, “é relativamente baixa”, segundo o analista, e o país não cobra imposto sobre herança.
A Costa Rica vem entrando e saindo da lista de paraísos fiscais, elaborada pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A Costa Rica não cobra impostos sobre lucros de capital recebidos no exterior
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Empresas de consultoria, como a Offshore Protection, destacam que, embora não seja considerada um paraíso fiscal puro e simples, a Costa Rica oferece incentivos financeiros atraentes, que já foram comparados com a Suíça, tanto para pessoas físicas quanto jurídicas.
Por isso, o país se tornou “um destino favorável para pessoas que pretendem otimizar sua situação fiscal”.
Seu sistema tributário e “as sólidas leis de sigilo bancário do país” fazem da Costa Rica um país atraente para investidores e pessoas com alto patrimônio.
Ao lado da privacidade financeira, o país está no Top 10 do ranking de vistos dourados para estrangeiros com direito a residência.
Uma das formas de obter o visto é investir pelo menos 150 mil dólares (cerca de R$ 798 mil) em imóveis, o que é muito fácil para pessoas que possuem grandes fortunas.
O país também é considerado seguro. A Costa Rica tem bairros de luxo bem estabelecidos e alto padrão de vida, em comparação com outros países latino-americanos.
Some-se a isso, segundo Amoils, seu estilo de vida, suas praias, paisagens, aves e florestas tropicais.
“Esperamos que as fazendas ecológicas decolem na próxima década”, acrescenta ele, algo que poderia atrair mais indivíduos de alto nível econômico.
Mas a segurança na Costa Rica mudou nos últimos anos. Um relatório da OCDE publicado em junho alertou sobre o aumento da insegurança no país.
“O aumento da violência e da criminalidade poderá prejudicar o turismo e a entrada de investimentos estrangeiros diretos”, destaca a publicação.
Há algumas semanas, o Centro de Estudos do Turismo (CET) costa-riquenho informou que a insegurança dos cidadãos se consolidou como o principal risco para o desenvolvimento do turismo. Com isso, vem se deteriorando a imagem da Costa Rica como destino seguro, um dos principais atrativos do país há décadas.
Guanacaste: símbolo do boom e do deslocamento da população local
Existem muitas regiões do país que se transformaram em ímãs para atrair riqueza.
No lado oeste do Vale Central da Costa Rica, ficam as cidades de Escazú e Santa Ana. E, no litoral, existem cidades que sofreram crescimento explosivo, como Nosara, na província de Guanacaste.
Guanacaste se transformou no símbolo deste boom de milionários.
A província tem seu próprio aeroporto internacional. E, em 2024, pela primeira vez, foi a região onde mais cresceram os projetos de construção civil no país.
Dados do Observatório do Turismo, Migrações e Desenvolvimento Sustentável da Região de Chorotega, da Universidade Nacional da Costa Rica, indicam que, entre 2017 e 2023, o preço dos imóveis aumentou em até 400%. Este período inclui o “efeito pandemia” verificado no setor imobiliário.
Para o coordenador do estudo, Esteban Barboza Núñez, o aumento do valor das propriedades na província “encareceu o preço dos alimentos e do aluguel, o que, evidentemente, prejudica principalmente as pessoas de baixa renda”.
Foram geradas bolhas dentro das economias locais, segundo a pesquisadora e professora da Faculdade de Economia da Universidade da Costa Rica, Daniela Córdoba, em entrevista à BBC News Mundo.
Guanacaste faz parte da Região Chorotega, onde 24,5% da população vive na pobreza.
O surgimento dessas bolhas de luxo em regiões pobres, em muitos casos, provoca o deslocamento da população local, segundo Córdoba, em um processo conhecido como gentrificação.
Organizações comunitárias realizaram protestos pacíficos nas ruas contra a gentrificação. Elas exigem maior regulamentação do acesso à terra e a compra de imóveis para proteger as comunidades locais.
“Guanacaste possui a maior proporção de casas vazias em todo o país”, escreveu a especialista em saúde pública e políticas de desenvolvimento Isabel Muñoz Baulieu, em um artigo opinativo. “Mas uma em cada dez pessoas de Guanacaste foi empurrada para viver em assentamentos informais.”
Muitos moradores de Guanacaste se queixam que as construções de luxo não melhoraram a infraestrutura local, nem geraram empregos sustentáveis de qualidade com o passar do tempo.
Além disso, elas geraram efeitos negativos sobre os escassos recursos hídricos existentes na província.
A migração de milionários disparou desde a pandemia, segundo o sócio-diretor da empresa The Agency Costa Rica, Andrés Riggioni
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Panorama regional
O relatório da Henley & Partners indica que os países da América Latina e do Caribe onde a chegada de milionários mais cresceu na última década são a Costa Rica, o Panamá e as ilhas Cayman:
Costa Rica: 72%
Panamá: 69%
Ilhas Cayman: 62%
Bermuda: 51%
México: 16%
Por outro lado, países como a Colômbia, o Brasil e a Argentina observaram queda da migração de indivíduos com patrimônio elevado para o seu território.
Em nível mundial, o ranking de aumento da chegada de milionários na última década é liderado por Montenegro, Emirados Árabes Unidos, Malta, Estados Unidos, China e Costa Rica.
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